29 março 2006

28.03 a 01.04.2006 - Ushuaia (Argentina)

Enfim, Ushuaia, Tierra del Fuego, a cidade mais austral da Argentina, o lugar onde literalmente termina o asfalto. Daí saem os barcos para a Ilha Navarino, Cabo Horn e Antártida.

Ushuaia é uma cidade gelada e cinzenta, mas muito bonita e acolhedora, espremida entre o Monte Martial (sempre gelado) e o Canal de Beagle.

Lá chove, chove...

Ushuaia é ponto de partida de todas as expedições que rumam para a Antártida. É impregnada pela cultura dos indígenas que ocupavam a região, e pelo presídio que funcionou até 1947.



É uma cidade ligada ao mar e às navegações de exploração dos mares austrais e da Antártida, portanto cheia de histórias sobre navegantes, navios e naufrágios.

A pesca é abundante, e a centolla, uma espécie de caranguejo gigante, é o prato típico da região.


Do outro lado do Canal de Beagle a paisagem é dominada pela Ilha Navarino, território Chileno.

Um conflito limítrofe entre Argentina e Chile acerca da soberania sobre três ilhas no Canal de Beagle (Picton, Lennox e Nueva) foi, no passado, submetido ao laudo da Coroa Britânica.
Em 1977 a resolução desfavorável à Argentina provocou uma reação imediata do então governo militar argentino.
A guerra parecia iminente no ano de1978, e a tensão, que teve até mediação do Papa João Paulo II, não se resolveria até a assinatura do Tratado de Paz e Amizade de 1984.
A soberania chilena sobre as ilhas é hoje indiscutível.

O Estreito de Beagle (ou Canal de Beagle) separa as ilhas do arquipélago da Terra do Fogo, no extremo sul do continente.

Ele separa a “Isla Grande” de diversas ilhas ao sul.

Sua parte oriental marca a fronteira entre o Chile a Argentina, mas sua parte ocidental pertence ao Chile.

Parece confuso ? E é mesmo. Só pegando o mapa para entender.

Este mapa é do guia da Argentina.



Em 1896, como estratégia de ocupação militar da região, um grupo de 14 presidiários autores de graves delitos ou considerados muito perigosos, alguns deles condenados a reclusão perpétua ou de longa duração, foi enviado para Ushuaia.

Assim foi como se iniciou o “Cárcere de reincidentes”, instalado inicialmente em casas de madeira e chapa.

Em 1902 os detentos do “Presídio Militar”, que até então estavam na Isla de Los Estados, foram transferidos por razões humanitárias para Puerto Golondrina, ao lado da Baía Lapataia, também em Ushuaia.
Num regime de trabalho retribuído, os detentos foram utilizados como mão-de-obra na construção do “Presídio Nacional”, em trabalhos para a comunidade (construindo ruas, pontes, edifícios) e também, a partir de 1910 daquele que se tornaria “el tren más austral del mundo”.

Essa pequena ferrovia, de quase 25 km ligava a cidade à região onde hoje se reserva ao Parque Nacional de Tierra Del Fuego.

Em 1911 foi assinado o decreto de fusão dos dois presídios no prédio construído pelos detentos.

Com o tempo, para lá também foram enviados presos políticos.

Em 1947 o presídio foi desativado e suas instalações transformadas numa base naval da Marinha.

A história do presídio, dos detentos, do “Tren del fin del mundo” e também do mar da região fazem parte da história de Ushuaia, e estão atualmente reunidas no prédio construído pelos detentos, agora transformado em dois museus -
o Museu do Presídio e também o Museu Marítimo de Ushuaia, que mantém uma coleção muito interessante de materiais náuticos, documentos, barcos e miniaturas de navios.

Chove muito, mas quando o sol aparece, o colorido do mar e dos telhados de zinco se destaca.

A neve prevista no site da wunderground não veio.

Ushuaia tem muitas construções bonitas (antigas e modernas), de arquitetura típica, muito simples.

Por serem adequados ao clima frio e chuvoso e também à neve, os telhados metálicos predominam.

As casas são aquecidas e aconchegantes. Os restaurantes normalmente têm cabides para os casacos, capas e guarda-chuvas.

Aliás, em todas as etapas de viagem (exceto Buenos Aires) o clima foi muito parecido.

O canal de Beagle deve seu nome ao navio britânico HMS Beagle, (vale a pena dar uma olhada no link) que fez parte de duas missões hidrográficas nas costas meridionais da América do Sul no início do século XIX.

Durante a primeira, sob o comando do australiano Philip Parker King, o capitão do Beagle, Pringle Stokes, suicidou-se e foi substituído pelo capitão Robert Fitz Roy.

A segunda, muitas vezes chamada de "A viagem do Beagle", é célebre porque levava a bordo Charles Darwin, e este é outro link que vale a pena ler com calma.
A propósito, vi na Livraria Cultura uma edição do diário que Darwin escreveu nessa viagem, intitulada “Beagle”, lançada neste ano, 2006.

O navio da foto em b&p NÃO é o HMS Beagle. É o rebocador “Saint Christopher”, que faz parte da paisagem de Ushuaia. Foi trazido em 1953 para participar dos trabalhos de resgate do navio de passageiros “Monte Cervantes”, que naufragou no Canal de Beagle em 1902. A tentativa de fazer o barco flutuar de casco para cima não deu certo. O navio se partiu em dois, o prejuízo foi enorme e o rebocador ficou por ali, abandonado desde aquela época.
Há diversos barcos no Muelle (píer) turístico de Ushuaia oferecendo excursões para todos os lados do canal, e até mesmo viagens de 4 dias para os fiordes do Chile.

Encarar o frio e o vento não é problema, desde que você não resolva bancar o herói.

Vá preparado para o frio e para os respingos gelados, porque senão não dá para sair do interior do barco.

O “Barracuda” é um barco aconchegante, tem uma área externa com visão muito boa, e um interior aquecido para tomar chá, secar as roupas e descongelar o nariz.
O problema é que a gente não consegue fotografar tudo o que quer, porque o barco PASSA mas NÃO PÁRA nas ilhas. Portanto, para fotografar as ilhas, só com teleobjetiva.

Só que o vento é fortíssimo, o barco não pára de balançar.

E teleobjetiva com movimento não dá certo...
Não consegui fotografar a Isla de los lobos (marinhos) –nem- los lobos (marinhos) porque demorei muito para fazer a máquina focar. O barco balançava demais. Quando percebi que o barco estava indo embora, já não havia mais nada que prestasse para fotografar.

Mas a partir daí fiquei mais esperto, e consegui fotografar “la Isla de los pájaros” e “il Faro Les Eclaireurs”.

Os pájaros em questão são os cormorões, que de longe parecem pingüins.

Apesar dos atritos Argentina x Inglaterra por conta das questões de fronteira, com destaque para as guerra das Malvinas, a influência inglesa por aqui é muito grande, devido à presença dos missionários ingleses na colonização da Tierra del Fuego. Claro que o ônibus do city tour –não- é dessa época.


Fui ao “Museu del fin del Mundo”, instalado numa construção onde funcionou o primeiro armazém do povoado, agora restaurado. Tem uma seção dedicada à história da região, com muita ênfase às 3 tribos indígenas que haviam por ali antes da chegada dos colonizadores, e ao trabalho das Missões Anglicanas e Salesianas que estiveram por ali.

Há também uma ala com muitas aves empalhadas, uma outra replicando o ambiente do armazém original, e uma livraria bem abastecida com material da região, onde, finalmente, achei um livro de Francisco Coloane, escritor da Patagônia que não é editado no Brasil. Não encontrei “Tierra del fuego” que eu procurava, então trouxe o “Velero anclado”.

Bem em frente ao Museu, que também fica de frente para o canal, aproveitei um dos poucos momentos que deu para tirar o gorro e o cachecol e tirar a foto-padrão de turista "olha nóis em Ushuaia".


A subida até o Glaciar Martial, ou pelo menos quase até lá, vale a pena.

Na aerosilla, que é como chamam o teleférico por aqui, o frio e o vento dão a sensação de que você está num avião, só que do lado de fora.

A aerosilla só vai até a metade do caminho. Depois tem uma caminhada em subida, de mais de uma hora.

Sem botas de trekking, nem pensar. Aliás, sem botas de trekking impermeáveis e aquecidas, nem pegue o avião em Guarulhos. Tudo por aqui é frio e molhado.

Se você não tem uma bota de trekking, faça como o tio Gilberto que comprou a dele 2 meses antes e veio com ela já amaciada e calçada desde São Paulo.

No início da subida ao Glaciar tem um abrigo de madeira bem aquecido, onde a gente pode tomar um chocolate na ida e uma sopa com vinho na volta, enquanto reorganiza as luvas, gorro, cachecol...

...para a caminhada.

Para a frente, o bosque de lenas, que eu só tinha visto em folhinhas e em quebra-cabeças de 3000 peças.


Para trás, Ushuaia, o canal de Beagle e a Ilha Navarino.


Note que o abrigo e o ponto final da aerosilla já sumiram lá embaixo.



Dica: Leve só chocolate e barra de cereais, porque tem água limpa e gelada por todo o caminho.
E claro, leve a câmera.


E por falar em fotos, separei as melhores e incluí no meu álbum de fotos que eu gosto mais, no UBBI, que já está com mais de 70 fotos.

Se não cair direto no álbum, procure pela opção – título do álbum – (o título do álbum é “periskopio”).

Em Ushuaia o sol aparece sempre meio de lado.

Como os buracos na camada de ozônio se formam nos pólos, é bom usar filtro solar o dia inteiro...


...mesmo a 2 graus negativos.
A ruta 3 é a estrada que vai ao “fim do mundo”, pouco mais de 20 km adiante de Ushuaia, no Parque Nacional Tierra Del Fuego, mais precisamente na Baía Lapataia.
É literalmente o - fim do asfalto - em termos de hemisfério sul, como diz a placa.

O parque tem estrutura de camping, é muito limpo, bonito e sinalizado.

A primeira surpresa: Para entrar nos parques nacionais da Argentina se paga ingresso, e a tarifa é diferenciada: 5 pesos para os cidadãos argentinos e 20 para os outros.

Em tempo: No Chile é a mesma coisa.

Uma idéia que poderíamos adotar no Brasil.

Apesar de muito bonito, chovia, estava escuro e frio, não tinha muita coisa para fotografar a não ser a Baía Lapataia em preto e branco.

Um coelho ! Todo mundo falando baixinho para não espantar a paisagem.


Só que alguns metros adiante a paisagem ficou monótona...


Os coelhos estão por todo o parque, se multiplicam feito coelhos.


Aquelas bolinhas que estão pelo parque inteiro, e que a gente pisa o tempo todo pensando que são sementes, sei lá o quê, são bostinhas de coelho.


Bom, as fotos que eu tirei no parque não são interessantes, e não vi os castores, que são considerados um problema.

Primeiro porque eles não gostam de posar para fotos, só aparecem muito cedo ou muito tarde, e segundo porque –não- são espécie nativa da região. Foram levados para lá há muito tempo.


como não tem predadores, se multiplicaram de forma descontrolada a ponto de causarem um desequilíbrio ecológico.

Isso aí é o que sobra depois que o castor passa pela floresta.

O castor parece madeireiro na amazônia - por onde passa, não deixa nada.

E para encerrar a etapa Ushuaia, uma pequena idéia do que é uma centolla (pronuncia-se “centolha” mesmo).
Esse é o folder do “Tia Elvira”, um restaurante muito simpático, de frente para o canal de Beagle, e a centolla é esse caranguejão que aparece no logotipo. É comum a centolla ser maior do que a roda de um carro, por isso nunca se come uma centolla inteira, mas sim pedacinhos dela..
Aliás, em Ushuaia come-se muito bem. Frutos do mar, Parrilla e Cordeiro da Patagônia são os pratos mais comuns e melhores. Aqui, restaurante a quilo chama-se “Tenedor libre”. Tenedor é garfo.

O vinho é sempre bom e presente, mas os legumes são escassos e as frutas poucas, ruins e caras.
Aviso aos navegantes: Não perca tempo tomando café no Chile ou na Argentina. Não tomei um que prestasse durante toda a viagem. Em compensação, o chocolate e o chá são sempre bons.

Não perca no próximo bloco, "Punta Arenas", no Chile.